O rápido e devagar no mundo das Startups

Recentemente temos sido expostos a uma série de conteúdos que divulgam o surgimento de uma quantidade avassaladora de startups. 

O termo unicórnio já passou a fazer parte do jargão do mundo dos negócios. Startups que atingem o extraordinário valor de mercado acima de 1 bilhão de dólares se multiplicaram e têm tomado conta do noticiário de negócios. E não é para menos. 

Segundo dados da 100 Open Startups, a média de novas startups registradas no programa por mês subiu de 120 em 2015 para mais de 330 em 2018. O volume de investimento de venture capital no Brasil, nesse mesmo período, subiu de cerca de R$ 1,5 para mais de R$ 5 bilhões. 

Se antes de 2015 não existiam unicórnios no País, em 2019 já são 10 registrados. Para o ano que vem existem projeções para o possível anúncio de dois ou três novos negócios neste tamanho por mês. 

A existência de um ecossistema pujante de surgimento e investimento em startups nos leva a rápida conclusão de que, cada vez mais seria observado o enfrentamento entre empresas incumbentes versus insurgentes. 

Entretanto, o que observamos no país é um outro fenômeno massivo no ambiente de inovação: médias e grandes empresas aliando-se a startups em um grande movimento de open innovation. 

Em 2019, a 100 Open Startups anunciou que desde 2015 até o momento, mais de 960 médias e grandes empresas firmaram pelo menos um acordo de parceria, contratação ou investimento com 1.200 startups, resultando em um total de 7.800 relacionamentos estabelecidos. Foram mapeados mais de 200 programas de open innovation presentes no mercado. 

Reconhecidamente, um dos grandes atributos de vantagem competitiva das startups é a sua velocidade. Porém, junto com essa velocidade vem também a sua fragilidade. 

Assim como surgem muitas startups a cada mês, a plataforma 100 Open Startups desabilita do programa, mensalmente, cerca de 180 startups, por inatividade. A inovação não é um fenômeno controlado apenas pelos seus criadores, o último estágio do processo de inovação é a sua adoção no mercado. Sem adoção não há inovação. 

Com menos a perder, dado que não tem legado ou base de clientes anterior, a estratégia das startups é promover mudanças radicais. Errar o tempo e cadência da adoção das inovações propostas pode lhes custar muito caro. 

É bem sabido no mundo das startups que mesmo atingindo a marca de unicórnio, valor atribuído por investidores, nem sempre estes novos negócios acertam esse timing de mercado e mesmo os unicórnios estão sujeitos ao fracasso. 

Essa dicotomia entre o rápido e o devagar foi bem descrita pelo psicólogo Daniel Kahneman, ganhador do Prêmio Nobel de Economia de 2002 em seu livro “Rápido e devagar: Duas formas de pensar”. 

De um lado temos um sistema de pensamento rápido, intuitivo e automático. Do outro um pensamento mais lento, reflexivo e analítico. A insurgência massiva das startups tem criado um efeito de pavor entre executivos de empresas incumbentes e um efeito de ganância entre investidores menos experientes. 

Entretanto, se olharmos um pouco mais a fundo, é reconhecido entre investidores profissionais de venture capital, que entre a criação de uma startup realmente inovadora e a criação de um negócio sustentável, o tempo de maturação é da ordem de oito a 10 anos. Não é à toa que a maioria dos fundos de investimento em startups tem duração de um década para retorno do capital aos seus investidores.  

Diante de um cenário onde, incontestavelmente, as mudanças têm sido cada vez mais rápidas, a quantidade de startups vem crescendo exponencialmente e as empresas estabelecidas estão reagindo massivamente com movimentos de open innovation. 

Então, qual deve ser a postura dos profissionais da nossa geração? Manter-se calmo em sua zona de conforto e esperar a tempestade passar imaginando que dias de calmaria virão? Trocar imediatamente de emprego buscando empresas mais preparadas para lidar com o desafio da inovação? Ou correr para abrir sua startup e submeter-se a árdua tarefa de empreender, mesmo sabendo que lutará contra a estatística em meio a milhares de empreendedores buscando por recursos?

Quando criamos a 100 Open Startups em 2015, previmos e agimos frente a este cenário. Convidamos a massa de empreendedores e executivos de empresas estabelecidas a trabalharem conjuntamente na criação de um ambiente colaborativo para a inovação. 

Não exploramos o “medo de ficar de fora” ou a ganância por lucros extraordinários. Nossa recomendação para empreendedores foi abrir seus projetos e planos para a cooperação com empresas estabelecidas, diminuindo o risco de criarem startups por puro reflexo, e podendo contar com o apoio de estruturas mais sólidas para construir negócios reais e sustentáveis no longo prazo. 

Para os profissionais de empresas estabelecidas, sugerimos que a interação com as startups seria uma alternativa para identificar onde, de fato, existiam oportunidades e quais seriam as barreiras para as inovações propostas. 

Em quatro anos, somamos mais de 25.000 executivos representando 2.400 corporações estabelecidas, estas colaborando com uma massa de 30.000 empreendedores representando 9.000 startups. 

Inicialmente, colocamos em contato startups e executivos por um processo de matchmaking via aplicativo, explorando a afinidade entre a proposta das startups e os interesses dos executivos. Em seguida, os executivos foram convidados a fazer uma rápida avaliação dos projetos que lhes interessavam. Desta forma, em um segundo momento, pudemos explorar via reuniões presenciais de speed-dating, o encontro entre as startups que despertaram mais interesse, com os executivos que mais tiveram matches com essas startups. 

À medida que empreendedores e executivos passam a se conhecer e estabelecer uma relação de confiança, o relacionamento pode culminar em uma parceria de negócio, contratação de serviços e até mesmo investimento por parte da empresa que o executivo representa. Essa informação das startups que apresentam melhor desempenho na avaliação e na geração de negócios, com empresas estabelecidas, cria também uma confiança junto a investidores, contribuindo para que as startups mais atraentes do programa recebam investimento. Ao todo, 410 startups receberam R$600 milhões nesses quatro últimos anos. 

Desta forma, caem os mitos sobre o pavor, velocidade frenética, ganhos extraordinários, e surge um movimento mais sólido e real, no qual o empreendedor deixa de ser um herói solitário, que constrói impérios por mérito próprio, e passa a fazer parte de redes colaborativas de inovação. 

Neste cenário, executivos de empresas estabelecidas passam a compreender melhor o ritmo real da construção de startups e conseguem contribuir com o sucesso de suas inovações. 

O projeto da 100 Open Startups é que, cada vez mais, executivos se envolvam com o ambiente de startups. Inicialmente, tomando conhecimento das startups que estão surgindo em seu campo de atuação e avaliando de forma rápida, recomendavelmente 100 projetos. E em um segundo momento, participando de eventos onde são promovidos os encontros presenciais de speed-dating para interagir, idealmente, com uma base de 10 startups selecionadas. E, se a oportunidade surgir, estabelecendo uma relação mais próxima com talvez uma startup, com a qual irá contribuir e aprender junto. 

Fonte: Publicado originalmente na coluna de Bruno Rondani, CEO da 100 Open Startups, no portal Whow!

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